Num universo onde o dinheiro parece abrir todas as portas, existe uma sala à qual nem todas as carteiras têm acesso. Em Molsheim, sede da Bugatti, a exclusividade não se mede apenas em milhões, mas em reputação, história e um certo código de conduta. Algumas figuras públicas, por mais que desejem, descobriram que o seu nome figura numa lista invisível — aquela que os impede de adquirir uma nova obra de arte sobre rodas da marca francesa.
Alegadamente, o critério de seleção da Bugatti transcende o mero poder financeiro. A empresa, herdeira do legado visionário de Ettore Bugatti, opera sob uma filosofia onde cada automóvel é uma declaração, uma peça de museu em movimento. “Se é comparável, não é um Bugatti”, proclamou o fundador, estabelecendo um padrão que vai muito além da velocidade ou do luxo. Trata-se de uma promessa de “irrepetibilidade”.
Esta abordagem singular levou à criação de uma barreira discreta, mas intransponível, para certas personalidades. Tom Cruise, cuja paixão por automóveis é bem conhecida e cujo garagem é um tesouro de clássicos, viveu o episódio que selou o seu destino com a marca. Durante uma estreia cinematográfica em Hollywood, um momento de hesitação à porta de um Veyron, perante as objetivas do mundo, foi interpretado em Molsheim não como um contratempo, mas como um deslize que manchava a aura de perfeição e intuitividade que a marca cultiva. A imagem de dificuldade, ainda que fugaz, foi suficiente.
O cliente como um guardião
Mas não é apenas a gestão da imagem pública que conta. A Bugatti vê cada cliente como um guardião temporário de um legado. Assim, atos considerados como deslealdade ao espírito da marca são punidos com o exílio. Simon Cowell, o temível jurado de talentos, e o campeão de boxe Floyd Mayweather Jr., aprenderam esta lição da forma mais dura: ao colocarem os seus Bugatti no mercado pouco tempo após a aquisição, com quilometragens irrisórias, transgrediram um princípio não escrito de custódia dedicada. Para a Bugatti, vender rapidamente um dos seus criados é reduzi-lo a um mero ativo, um pecado capital no seu credo.
Até campeões do volante não são poupados. Alegadamente, Jenson Button, campeão mundial de Fórmula 1 em 2009, viu-se igualmente excluído pelo mesmo motivo: a venda prematura do seu exemplar. A mensagem é clara: em Molsheim, valoriza-se a paixão duradoura, não a transação efémera.
Por fim, o comportamento ao volante será ainda mais fundamental. O rapper Flo Rida, detido a conduzir o seu Veyron sob efeito de álcool, proporcionou à marca o tipo de publicidade que mais detesta: aquela que associa o seu nome a irresponsabilidade e perigo. O episódio, amplamente noticiado, garantiu-lhe um lugar permanente na lista não oficial dos indesejáveis.
Mas olhe que não é sobre rejeição…
Por trás dos motivos aparentemente específicos, desenha-se uma narrativa maior. Fontes ligadas à Bugatti explicam que a marca não vende automóveis; seleciona embaixadores. Num mundo de ostentação fácil, a marca mantém-se como um bastião de um elitismo peculiar, onde o capital financeiro é apenas o bilhete de entrada. A verdadeira admissão depende de um capital simbólico muito mais raro: a capacidade de honrar, sem falhas visíveis, o mito da perfeição que Ettore Bugatti um dia começou a construir. Em última análise, a “lista negra” não é sobre rejeição, mas sobre a preservação obsessiva de um sonho que, uma vez comparado, deixa de existir.
Fonte: TopGear, Marca
